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A construção da autonomia

“A autonomia é uma construção cultural, não é algo natural, depende da relação do homem com os outros e destes com o conhecimento… ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou sua construção”. 

Paulo Freire

Nos meus anos como educadora, sempre achei fascinante a capacidade de aprendizagem do ser humano. Tive a “sorte” e a honra de iniciar minha carreira na Educação Infantil, onde observei e vivenciei, com grupos de alunos distintos, a construção da autonomia. Com o passar dos anos, tive a oportunidade de trabalhar com estudantes de faixas etárias diferentes, desde a primeira infância até a fase adulta. E hoje, tenho a alegria de estar bem próxima dos alunos do 9º e Ensino Médio e posso constatar que o processo de construção da autonomia acontece de forma semelhante, resguardando a faixa etária. Crianças pequenas conseguem ser autônomas em atividades e tarefas com um grau de complexidade menor, e depois essa complexidade vai aumentando.  

Piaget nos apresenta, em seus estudos, que existem três fases do desenvolvimento moral: anomia, heteronomia e autonomia. A anomia acontece de 0 a 2 anos, quando há ausência total de regras, pois nascemos sem a consciência do certo ou errado. O pensamento ainda é bastante difuso, o que torna a absorção das regras muito difícil. Por isto, a necessidade da repetição de orientação, as “birras” são frequentes nesta fase, mas aos poucos o bebê vai absorvendo e aprendendo as regras. Desde pequeno, ele precisa entender que não conseguirá o que quer desta maneira, mas não espere de um bebê a compreensão da regra com uma única explicação.  

Heteromia significa ser governado por outros, fora de nós. De 2 a 12 anos, a criança segue regras com maior facilidade de internalização, sendo menos questionadora, tendendo a ser mais obediente. A criança avalia aquilo o que é bom ou ruim por meio da obediência às regras. Elas seguem as regras não porque pensam sobre ela, mas porque elas existem e precisam obedecê-las, assim também é a sua avaliação dos atos. Nos últimos anos dessa fase, para que a obediência seja construída e que a moral autônoma seja conquistada, a criança tem a necessidade de entender a regra, não a obedecer porque alguém mandou, e sim obedecê-la porque conseguiu fazer uma construção sobre a necessidade daquela regra. Um cuidado nessa fase é o de não podar muito a criança, pois, caso ocorra, ela se tornará um adulto heterômico, ou seja, incapaz de pensar por si mesmo, de refletir, de construir novas regras e novos caminhos. 

Até aqui, tarefas de menor complexidade podem ser propostas para as crianças desde a primeira fase, por exemplo, crianças pequenas de 2 a 3 anos já podem escolher a roupa que vestirão. Os pais podem dar 2 opções de “look” para a criança, e ela terá que decidir por A ou B. Como as crianças são muito pequenas, inicialmente, não deixamos a disposição o guarda-roupa inteiro. Por mais simples que pareça a escolha de uma roupa, muitas opções podem gerar ansiedade, angústia e insegurança, por isto a necessidade da ajuda dos pais pré-estabelecendo as duas opções.  

Crianças de 4 a 6 anos conseguem fazer várias atividades de forma autônoma, com a supervisão e orientação de adultos. Ao longo do tempo, quando já estão confiantes, já conseguem executá-las sem a necessidade de ajuda ou supervisão, como a escovação por exemplo. As crianças de 7 anos até a adolescência já são capazes de gerir conflitos, conseguem conversar com os pares para resolverem os desentendimentos. 

A partir dos 12 anos, a fase da autonomia se inicia. Nesse momento, o indivíduo passa a se relacionar com as regras e sugerir novas também. Refletem criticamente sobre as questões colocadas e conseguem propor mudanças, primeiramente visando ao benefício próprio, mas depois pensando na justiça e no bem comum. 

Autonomia, como diz Paulo Freire, não é natural e sim aprendida. E como todo aprendizado, precisa de bons exemplos e acompanhamento constante, para que a construção seja consolidada. Autonomia requer orientação e acompanhamento. É necessário que tarefas sejam delegadas (não largadas e não acompanhadas) para que possam ser executadas. Primeiro, são acompanhadas de perto e, quando o indivíduo já está mais confiante, deixamos que as execute sozinho sob a nossa supervisão, até que consiga fazer sozinho a tarefa. 

Todo indivíduo deve ser estimulado desde pequeno a fazer suas próprias escolhas, ser autônomo. O princípio da autonomia exprime a capacidade do indivíduo de decidir por ele mesmo. Sendo assim, incialmente as escolhas devem ser pequenas e simples. Gradativamente, o indivíduo irá adquirindo confiança e autonomia correspondente com a idade.   

Quando tiramos a oportunidade de nossos filhos executarem tarefas simples, deixamos subentendido que eles são incapazes, que não conseguem resolver nada sozinhos e que precisam sempre da nossa ajuda e do nosso olhar. Estamos privando a confiança que eles têm neles mesmos.  

Com isto, teremos adultos que provavelmente apresentarão traços de insegurança, angústia, desespero e dependência em situações em que escolhas devem ser feitas. Sempre precisarão de alguém traçar o caminho para eles, pois, como ele nunca teve que fazer escolhas, gerir conflitos, lidar com frustrações, ele não saberá como agir e irá escutar e ouvir quem lhe parecer mais forte (seguro de si).  

Acredite, seu filho é capaz de executar tarefas, fazer escolhas e gerir conflitos. Fazer escolhas é lidar com frustação, e todo indivíduo precisa desse aprendizado desde cedo. Vamos criar pessoas autônomas, pois a confiança gera segurança e, apesar de todos os problemas, serão possivelmente seres humanos felizes e realizados! 

 

A animação acompanha a vida de pai e filho e mostra como o encorajamento, o incentivo e a confiança estão presentes nessa relação repleta de amor e sensibilidade.

 

Cristina Paulinelli

  • Segmento Educacional

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